terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Freixo do Meio

E passado algum tempo, da última vez que o mesmo sentimento me percorria a alma, novamente o sentia. Tão forte e profundo como da última vez...
Mochilas às costas depois de uma noite pouco dormida, com montes de miúdos pequenos excitados aos pulos à nossa volta. A curiosidade a apelar aos sentidos e o frio nas pernas a fazer ar condicionado nos furos dos bolsos dos calções.
E finalmente chegara a hora.
Depois de muitas peripécias, chegáramos ao local com equipas formadas.
Pela primeira vez, senti um peso que nunca tinha sentido antes num acampamento: o peso de ser a mais velha da minha equipa, o peso de ter de "tomar conta" de todos os outros que integravam a minha equipa, o peso da responsabilidade. Ao ínicio este peso foi encarado por mim como um fardo, um fardo talvez demasiado pesado para mim, que me auto-intitulo de escoteirinha e não de ESCOTEIRA.
Por essa minha visão, tão pessimista e que me subestima e por vezes limita, as coisas não correram como era esperado, e uma das lobitas que tinha à minha responsabilidade teve de jantar tarde... Acreditei que não seria capaz de levar avante o desafio e senti a desmotivação a invadir-me, e à noite, aconchegada no meu saco de cama, com ressonares vários em meu redor pensei que seria inútil para a minha equipa.
A manhã seguinte chegou a correr, e foi quando tive de ajudar um pequeno a ultrapassar as saudades duras de casa e do conforto dos pais que percebi que aquele peso que antes me parecia impossível de suportar, pode ser tão agradável e saboroso quando conseguimos pôr um sorriso no rosto de um daqueles putos! A sério, o cantar é uma força tão poderosa quando usada na altura certa.. E o dia foi andando, muito bem, com todas as suas peripécias.
E assim que me sentia menos capaz, que me sentia muito pequenina para aqueles pequeninos, olhava o rio gigante que se estendia diante de mim, olhava o céu negro sobre mim, olhava as pastagens de um verde forte cheias de animais que passeavam.
Quando, na carrinha de caixa aberta enroscada em todos os outros escoteiros, debaixo do meu impermeável, senti o vento gelado na cara e o cabelo a voar, TIVE A CERTEZA. Estou onde quero estar, e o peso da responsabilidade é um peso confortável, como o peso do lenço que nos aconchega e nos acolhe quando queremos.
OBRIGADA ! Boa caça...

2 comentários:

teresa disse...

Gostei de ler o teu depoimento, miúda.

Em primeiro lugar, porque estava escrito num Português saudável e, mais do que isso,por ter sentido sinceras as ideias do teu texto (e aqui 'fala' a deformação profissional da profe de Português...eh,eh...).

Em segundo lugar, mas mais importante ainda, porque para uma mãe é bom ver uma filha tornar-se autónoma e responsável, vindo-me aqui à memória a aprendizagem de que se começa a ser adulto quando conseguimos sair das fronteiras pessoais (o vulgar 'olhar para o próprio umbigo') e entender que os outros existem e que nos sentimos bem por lhes sermos úteis. Por aqui que também passam o espírito de cidadania, o conceito comunitário e o cimentar das responsabilidades. Não há nada melhor do que sentirmos que não somos ilhas... e que cantes sempre!
:)

Beijinho

mãe

Manuel Mealha disse...

E hoje é sem dúvida um dos momentos que mais me comove na vida de 10 anos de chefe. É este o momento em que vemos cumpridos todos os objectivos educativos de um jovem... É hoje que a lágrima me rasga o rosto até ao meu sorriso mais profundo.

Hoje é o dia em que leio um testemunho profundo e emotivo de uma jovem de 17 anos responsável, durante 4 dias, de 11 elementos com menos de 13 anos e uma mãe comovida por ver a sua filha mais "crescida".

Este é o momento que todos, mas mesmo todos de viam ler e perceber o que realmente é SER ESCOTEIRO.

Obrigado a todos os escoteiros de Sintra que directa ou indirectamente me fizeram pensar assim.